CIPÓ E A MÁSCARA DE LOBISOMEM

Cipó tinha dessas: perco o amigo, mas não perco a piada! Era início da década de 1990, quando em determinado período trabalhava nas madrugadas. Marcelino chegava em casa após o relógio estar cansado de girar, quando as únicas coisas de que se ouviam eram as grunhidelas noturnas, o canto das cigarras ou a vocalização dos sapos. As noites no oeste manauara da década em pauta eram sombrias, mas regadas de simplicidade e alegrias. Marcelino havia conseguido uma máscara de lobisomem em algum cafundó dos bregas, daquelas máscaras cheio de pelos na face, tão hedionda quanto o trabalho da cavalaria de polícia que patrulhava a área que, em vez de impor a ordem, impunham o medo nos bacuris que ficavam de bubuias pelas esquinas de Manaus, comendo dindim de cupuaçu, à espera do caroço. E quantas vezes eu, um desses bacuris, quase se mijou nas calças ao ver a cavalaria se aproximando. Cipó estava animado, à espera do horário de finalização do dia da labuta, ansioso pra chegar em casa e mostrar a novidade pros filhos e, principalmente, dar um baita susto na dona Pina; afinal, não era todo dia que se encontrava uma máscara de um ser lendário na Manaus dos anos 90. Passado o horário de saída do trabalho, cismo que o mesmo tenha estado se borrando de rir sozinho, enquanto andava pelas ruas a caminho de casa. Em certo momento, Cipó, ao se aproximar um desconhecido que vinha em direção contrária, na plena madrugada, colocou a máscara de lobisomem, no qual o homem, desvestido de coragem, correu aporrinhado pelas ruas para a baixa da égua. Marcelino estava até o tucupi de leseira baré, animado como um pinto na merda! Já estava brocado, precisava comer algo, com isso apressa os passos, pois sempre que chegava tinha pronto um rango chibata pra comer antes dormir. Ao se aproximar de casa, Cipó, despreocupado com as consequências, arruma a máscara de lobisomem, se prepara e bate na porta: toc, toc, toc. Dona Cristina: quem é? Seu Marcelino, mantendo o silêncio, bate novamente na porta: toc, toc, toc. Dona Pina abre uma fresta e, ao avistar aquele bicho feio com rosto peludo, mais que ligeira, grita mudamente: ê, carôço!, fechando prontamente a porta. Dona Pina corre pra pegar o terçado, com uma coragem de mãe disposta até a enfrentar um lobisomem pra proteger os filhos, que dormiam tranquilamente. Após alguns segundos, Pina pergunta: é tú, Marcelino? Se não for, capa o gato ou vou bandar no meio com meu terçado. Aquele terçado temos até hoje. Era tão enferrujado que se não morresse com o corte, morreria de tétano. Cipó não respondia nada, apenas batia na porta: toc, toc, toc. Pina retruca: se não falar nada, não vou abrir a porta. No qual Cipó, gargalhadeando, se manifestou dizendo: sou eu, Marcelino. Ao abrir a porta, já vai ouvindo os reclames de dona Pina: mas é um fuleiro mesmo! Quer me matar de susto, seu égua? Não satisfeito com a façanha, coloca a máscara novamente, pensando: deixa eu ver quem dos filhos separo a alma do corpo! Se aproximando do rosto de Junhoca, que ainda passou as mãos pelo rosto devido aos pelos da máscara, achando que era algum carapanã, o chama para que acordasse. Mas dona Pina intervém de imediato, dizendo: pega já o beco daí. Quer matar o menino de susto, seu égua? Aquela máscara nos alegrou por alguns dias, até ser destroçada pela dona Pina, para tristeza dos bacuris.

Jackson da Mata

8/23/20220 min read

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